Os bandhas do Haṭha Yoga

os-bandhas-do-hatha-yoga

1. Em suas palavras, o que são os bandhas?

A palavra bandha significa em sânscrito “fecho” ou “fixação”. Traduz-se como “contração”. Deriva da raiz bandh, que significa ligar, fixar. Bandha é o nome dado a um conjunto de técnicas usadas no Hatha Yoga com dois objetivos diferentes: um no plano sutil, e outro no plano denso, como veremos mais abaixo.

Os bandhas são contrações de determinadas áreas do corpo físico, como plexos, nervos, órgãos e glândulas, que estão relacionadas aos cakras, centros da energia vital, e que funcionam como canalizadores do fluxo energético. Quatro são de capital importância:

a) jalandharacontração da garganta,
b) uddiyanacontração do abdômen,
c) lacontração do assoalho pélvico, e
d) jihvacontração da língua.

Afora estes quatro, existem algumas combinações deles, que recebem nomes diferentes, como bandha traya, a “contração tríplice”, que consiste em fazer simultaneamente jalandhara, uddiyana e la bandhas, e mahā bandha (a “grande contração”, que é a combinação das quatro acima mencionados). Isso se faz durante a prática de certos prānāyāmas e em algumas meditações tântricas.

2. Por que tanto se fala sobre os bandhas? Qual a importância deles na nossa prática?

O Haṭha Yoga Yoga dá tanta importância à prática destas contrações pois, em primeiro lugar, elas possibilitam uma prática segura desde o ponto de vista físico. Na dimensão física, têm o objetivo de manter o calor dentro do corpo, de maneira a evitar lesões.

Na dimensão energética, os bandhas são usados para evitar a dispersão da força vital e conduzí-la pelos canais adequados, visando abrir suśumna nādī, o canal central da energia vital, possibilitando assim o despertar da energia sutil, kundalinī, conforme as instruções da HYP, II: 46.

a) Os bandhas e o corpo sutil

Em relação ao primeiro objetivo, é bom lembrar que a meta do Hatha Yoga é o despertar da energia sutil, kundalinī. Os bandhas são de imensa valia nesse processo. A Hatha Yoga Pradīpikā, um tratado antigo de Haṭha Yoga Yoga, chega a afirmar no terceiro capítulo que o despertar dessa energia depende diretamente da prática dos bandhas.

Através destas contrações, o yogi conduz a energia descendente, chamada apāna vāyu, para cima, e a energia ascendente, prāna vāyu, para baixo, confluindo ambos na altura do umbigo. A seguir, ele leva essas duas forças vitais a se concentrar na área do períneo, no cakra básico, produzindo desta maneira o despertar da força potencial, kundalinī.

A Haṭha Yoga Yoga Pradipika fornece instruções detalhadas sobre como aplicar os bandhas à prática da expansão da energia vital no prānāyāma. No terceiro capítulo, encontramos descrições minuciosas de cada um destes exercícios, na seção dedicada aos mudrās, com os quais o autor associa estas contrações.

b) Os bandhas e a saúde

Enormes benefícios obtêm-se da prática sistemática dos bandhas, tanto em nível fisiológico quanto em nível psíquico. É possível perceber melhoras no sistema endócrino, no funcionamento dos órgaõs internos, no sistema nervoso, bem como no funcionamento da própria mente, que fica mais focada e torna-se assim mais apta para a concentração.

3. Por que ouvimos mais sobre o la bandha do que sobre os outros?

Talvez a razão seja que, para muitos praticantes, o mūla bandha é de mais fácil execução do que o uddiyana ou o jalandhara bandha, quando associado à prática das posturas físicas. A execução correta do uddiyana durante a prática de ásanas envolve um domínio tal da musculatura do abdômen e do baixo ventre que muito poucas pessoas conseguem de fato fazê-lo bem. Por outro lado, o jalandhara e o jihva bandha, as contrações da garganta e da língua, são de uso bastante limitado, restringindo-se sua execução a algumas posições específicas.

O mūla bandha, que consiste em contrair e elevar o assoalho pélvico, está associado ao cakra básico, chamado mūladhara. Este centro de força sutil está por sua vez associado com o instinto de sobrevivência, a auto-confiança e o elemento terra, o que determina uma relação saudável com a matéria. Fazer mūla bandha nos ajuda a encontrar o centro do corpo de energia e estabelecer uma relação saudável com essa esfera sutil.

4. Que devemos fazer para conectar com os bandhas?

O mais essencial é permanecer consciente e ser capaz de integrar mūla e uddiyana bandha não somente na prática de āsanas ou prānāyāma, mas igualmente ao longo do cotidiano. Isso irá facilitar a manutenção de uma postura correta em todos os momentos do dia, independentemente da. Por exemplo, se eu fizer esses dois bandhas quando vou para o mar, durante a minha prática de surf, percebo que o meu corpo físico fica mais atento, mais acordado, e meus reflexos mais aguçados. Isso influi positivamente no ritmo respiratório e, conseqüentemente, na mente, que fica mais serena.

5. Você tem alguma sugestão de prática ou exercício ou leitura para nos aprimorarmos no nosso contato com os bandhas?

Muitos professores recomendamos a execução contínua das contrações do assoalho pélvico e do baixo ventre durante a prática de āsanas. Principalmente, nas posturas em pé. Isso dará mais firmeza à posição, e ajudará o praticante a enraizar-se com maior firmeza no chão. No entanto, quando o praticante encontra o alinhamento profundo na postura, estas duas contrações sutis acontecem de maneira espontânea. Esse é o motivo pelo qual alguns professores recomendam que, a priori, o praticante se concentre apenas na postura.

Pessoalmente, considero muito importante a associação dos bandhas com os āsanas, uma vez que o praticante ganha uma maior consciência do próprio corpo e da maneira em que a prática do Haṭha Yoga age sobre ele. Como os bandhas, por outro lado, nos ajudam a tomar consciência da energia vital, eles funcionam como uma ponte que liga o corpo físico ao corpo sutil, nos ajudando desta maneira a unir e focar as nossas próprias forças. Isso é Yoga, união.

Se o amigo leitor quiser se aprofundar no estudo, sugiro a leitura do clássico acima mencionado, Haṭha Yoga Yoga Pradīpikā, que está traduzido para o português e disponível gratuitamente para download em www.yoga.pro.br/artigos/76/3035/hatha-yoga-pradipika-introducao-e-capitulo-i

entrevista concedida a Greice Costa para a Prana Yoga Journal em 12/02/2007.